O Mundo Líquido - É bom refletir nesses tempos

Bauman argumenta que a sociedade atual é caracterizada pela incerteza e pela falta de estruturas sólidas, levando as pessoas a buscarem segurança em instituições e práticas que acabam restringindo sua liberdade. O medo gera ações defensivas que por sua vez alimentam o medo caracterizando a sociedade líquida com a segurança sendo alcançada à custa da liberdade. 

As pessoas enfrentam constantes mudanças e não podem contar com padrões ou sistemas previsíveis. Diante dessa incerteza, as pessoas buscam segurança em instituições e práticas que oferecem uma sensação de estabilidade e proteção. No entanto, muitas dessas instituições e práticas acabam limitando a liberdade individual, seja através de vigilância excessiva, controle governamental ou outras restrições impostas em nome da segurança. 

Essa busca por segurança em detrimento da liberdade é uma das características distintivas da sociedade contemporânea.

A violenta destruição da vida e da propriedade inerente à guerra, o esforço e o alarme contínuos resultantes de um estado de perigo constante, vão compelir as nações mais vinculadas à liberdade a recorrerem, para seu repouso e segurança, a instituições cuja tendência é destruir seus direitos civis e políticos. Para serem mais seguras, elas acabam se dispondo a correr o risco de serem menos livres.

Agora essa profecia está se tornando realidade. Uma vez investido sobre o mundo humano, o medo adquire um ímpeto e uma lógica de desenvolvimento próprio e precisa de poucos cuidados e praticamente nenhum investimento adicional para crescer e se espalhar - irrefreavelmente. Nas palavras de David L. Altheide, o principal não é o medo do perigo, mas aquilo no qual esse medo pode se desdobrar o que ele se torna. A vida social se altera quando as pessoas vivem atrás de muros, contratam seguranças, dirigem veículos blindados, portam porretes e revólveres, e frequentam aulas de artes marciais. O problema é que essas atividades reafirmam e ajudam a produzir o senso de desordem que nossas ações buscam evitar.

Os medos nos estimulam a assumir uma ação defensiva. Quando isso ocorre, a ação defensiva confere proximidade e tangibilidade ao medo. São nossas respostas que reclassificam as premonições sombrias como realidade diária, dando corpo à palavra. O medo agora se estabeleceu, saturando nossas rotinas cotidianas; praticamente não precisa de outros estímulos exteriores, já que as ações que estimula, dia após dia, fornecem toda a motivação e toda a energia de que ele necessita para se reproduzir. 
Entre os mecanismos que buscam aproximar-se do modelo de sonhos do moto-perpétuo, a autorreprodução do emaranhado do medo e das ações inspiradas por esse sentimento está perto de reclamar uma posição de destaque. É como se os nossos medos tivessem ganhado a capacidade de se autoperpetuar e se auto fortalecer; como se tivessem adquirido um ímpeto próprio - e pudessem continuar crescendo com base unicamente nos seus próprios recursos. [...]


FONTE: BAUMAN, Zygmunt. Tempos Líquidos. Trad. de Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007, p.15.

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